A carga tributária brasileira é alta? Ou é distribuída de modo muito desigual? Ou, além de alta, é distribuída de modo muito desigual?

Sucessivos governos fracassaram em suas tentativas de fazer uma reforma geral do nosso sistema tributário, inclusive os governos liderados pelos dois partidos que disputam a hegemonia na política brasileira desde a redemocratização, o PT e o PSDB.

O assunto é mesmo delicado e a composição do Congresso Nacional não ajuda. Ao contrário, a existência de uma miscelânea de partidos desprovidos de projetos estruturantes para o Brasil e fortemente assentados em interesses particulares de pequenos grupos conduz a maioria do parlamento para a busca da preservação de seus interesses imediatos. Assim, as grandes questões foram ficando de lado, entre elas a questão tributária.

Tributos x Renda

Retomando a provocação inicial, penso que a nossa carga tributária é alta e é baixa, depende do tamanho da renda de quem paga tributos. Sua marca mais profunda é a desigual distribuição. Os mais pobres pagam mais tributos do que os mais ricos; a União e os estados mais ricos ficam com a maior parte arrecadada.

É fácil entender por que os mais pobres pagam mais tributos. Essa “aberração”, criada pelas elites tradicionais, donas do dinheiro grosso, decorre do fato de que a maior parte da arrecadação é oriunda de tributos que incidem sobre o consumo e a produção e não sobre a renda e muito menos sobre o patrimônio.

Lembro o caso do ICMS: a alíquota é a mesma para o consumidor, independente do tamanho de sua renda. Tanto faz ele ganhar o salário mínimo, ou ser professor e ganhar três mil reais, ou ser promotor e ganhar mais de 30 mil reais, ou ser apresentador de TV e ter renda de mais de 100 mil reais por mês. Obviamente que os 17% embutidos no preço do frango pesa muito para quem ganha pouco e é insignificante para os setores de alta renda.

Estudo do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que, no Brasil, os 10% mais ricos contribuem para a arrecadação do País com 21% dos seus rendimentos, enquanto os 10% mais pobres contribuem com 32% dos seus rendimentos. Por essa equação perversa, os segmentos da parte de baixo da pirâmide social brasileira arcam com a maior a parte do custo do Estado brasileiro.

Outra forma de comprovar a injustiça: enquanto nos países capitalistas desenvolvidos 2/3 da arrecadação se originam de impostos diretos (aqueles que incidem sobre a renda), no Brasil os impostos diretos contribuem com apenas 13,2% da arrecadação.

Para completar, a arrecadação no Brasil não é distribuída de modo equitativo entre os entes federativos. Dados da Receita Federal mostram que, no ano de 2016, a União ficou com 68,2% da arrecadação, enquanto os estados e municípios tiveram que se virar com 25,4% e 6,3%, respectivamente.

Além disso, os estados mais ricos brigam pela manutenção da arrecadação na origem dos produtos e serviços. Por esse mecanismo, a contribuição social salário-educação referente aos funcionários de um banco que tem agência no Piauí, por exemplo, é recolhida no estado onde fica a matriz. Por esse atalho legal, São Paulo fica com a maior parte do bolo dessa contribuição. Então está comprovado que o sistema tributário é injusto, pois promove a concentração social e regional da renda.

Brasil e o resto do mundo

E quanto ao peso da carga tributária, como está o Brasil face ao mundo? Dados da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), citados pelo site Politize, mostram que o Brasil está na média. No ano de 2013, por exemplo, a carga tributária representou 33,7% do PIB, enquanto a média dos 35 países mais desenvolvidos ficou em 35% do PIB. Já na América Latina e Caribe, o referido indicador ficou em 22%.

Os dados internacionais mostram o Brasil numa situação complexa em termos de carga tributária. Há países que proporcionam boa qualidade de vida a seu povo e que têm uma tributação bem mais elevada. Exemplos: Dinamarca – 48,6%; França – 45%; Itália – 42,6%; Noruega – 40,8%; Alemanha – 36,7%. Mas também há países desenvolvidos que têm cargas mais baixas: Espanha – 32,6%; Canadá – 30,6%; Estados Unidos – 25,4%.

Obviamente que tratando de países tão diversos, muitos outros elementos de comparação teriam que ser usados para permitir uma análise mais profunda. Mesmo assim, fica patente a dificuldade de qualquer governo apresentar como solução para a falência fiscal do Estado um aumento na cobrança de tributos. Os casos da Espanha e principalmente do Canadá são emblemáticos, pois nesses países o Estado consegue resultados muito melhores em termos de atenção à população, ao mesmo tempo em que apresentam carga tributária menor.

Mas se o Brasil está abaixo da média dos 35 países da OCDE, por que a sensação permanente de que a carga tributária aqui é alta? Não é possível aprofundar esse debate neste espaço, mas cito elementos que me parecem fundamentais para explicar esse fenômeno político-psicológico: a) as enormes distorções, que obrigam os pobres a pagar mais tributos; b) a concentração da arrecadação na União e nos estados mais ricos; c) a baixa qualidade de muitos dos serviços prestados pelo poder público e, finalmente; d) a corrupção, que ajuda a aumentar a ideia de que tem muito recurso escoando pelo ralo.

sistema-tributario-impostos-brasilÉ possível mudar

Diante de tal quadro, recebendo a tarefa de exercer um mandato de deputado federal, terei como uma das bandeiras prioritárias o apoio a uma reforma tributária que seja capaz de enfrentar as distorções existentes, de proporcionar ao poder público recursos correspondentes aos serviços que presta à sociedade e principalmente de garantir a observação de princípios de justiça tributária, tanto em termos social quanto regional.

Penso numa reforma tributária que adote os seguintes princípios:

* Simplificação: não é possível continuar com esta parafernália de cerca de 80 tributos;

* Justiça Social: a estrutura tributária não pode ser fator de concentração de renda, assim os tributos devem incidir prioritariamente sobre a renda e não sobre o consumo;

* Justiça federativa: municípios e estados devem receber parcelas maiores da arrecadação, correspondentes ao aumento de suas atribuições;

* Reforma do Imposto de Renda por meio da criação de alíquotas específicas e mais elevadas para os setores de alta renda. Não é possível continuar com esse modelo de cinco faixas, em que o cidadão que tem renda de cinco ou seis mil reais paga sobre a mesma alíquota de quem ganha 30, 50, 100 mil reais;

* Redução de tributos sobre bens de consumo popular e bens essenciais como alimentos, água, energia, remédios, livros e material escolar;

* Recriação da alíquota de 15% de imposto de renda sobre as retiradas de Lucros e Dividendos, com a isenção de micro e pequenos empreendimentos;

* Suspensão da isenção fiscal concedida às petroleiras pelo governo Temer.

Essas e outras necessárias mudanças no sistema tributário, aliadas à indispensável busca de melhoria na gestão dos gastos, mediante a adoção de mecanismos de incentivo a bons resultados no serviço público, poderão proporcionar o almejado equilíbrio fiscal sem recorrer à fórmula sempre adotada pelos governos neoliberais, que implicam em maiores sacrifícios à população de modo a preservar os interesses do setor financeiro.

O princípio geral deve ser: tributos sim, mas mediante a prestação de serviços de qualidade a toda a sociedade.

 

Merlong Solano Nogueira
Professor da UFPI
Pré-candidato a deputado federal PT/PI

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